Valéria Dias / Agência USP de Notícias
Os historiadores que pesquisam a documentação do Departamento de Ordem Política e Social do Estado de São Paulo (DOPS), no Arquivo Público do Estado, sempre encontram dossiês e inventários que mostram as investigações ligadas aos movimentos de esquerda. Mas os agentes do DOPS também investigaram os movimentos de extrema direita, como o integralismo, mostra pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
“Os agentes do DOPS investigaram tudo, todos os partidos e forças políticas. E com o movimento integralista isso não foi diferente. Já a motivação para essa investigação variou de acordo com o período histórico”, revela o historiador e professor Renato Alencar Dotta.
O integralismo foi um movimento político de extrema direita, fundado pelo escritor Plínio Salgado, na década de 1930, e que tinha como ideologia a luta contra o comunismo, a oposição ao liberalismo econômico e a rejeição às ideias democráticas, como as eleições. A Ação Integralista Brasileira (AIB) foi lançada oficialmente em 7 de outubro de 1932, com a publicação do Manifesto Integralista.
Em sua tese de doutorado, Alencar Dotta pesquisou os dossiês do DOPS (e alguns prontuários) sobre o integralismo a partir de 1932 até 1979 (data em que foram encontrados os últimos documentos no DOPS sobre o movimento). O pesquisador constatou a existência de 4 momentos distintos da investigação realizada pelo DOPS: de 1932 até 1937, a partir da criação da AIB e as primeiras divulgações das ideias do movimento; de 1937 até 1945, já na clandestinidade diante do Estado Novo; de 1945 até 1965, com a fundação do Partido de Representação Popular (PRP); e durante a ditadura militar, de 1965 até 1979.
Motivações distintas
De 1932 até 1937, o integralismo cresceu livremente. “Mas o interesse do DOPS sempre esteve presente, pois a função da polícia política é fiscalizar tudo”, afirma o historiador. Foi neste período que o movimento se desenvolveu, foi tomando forma e aumentando seus adeptos. Assim como o nazismo, na Alemanha, onde as camisas marrons, a saudação “Heil Hitler” e a suástica identificavam seus membros, o integralismo adotou como símbolos as camisas verdes, além da saudação “Anauê” e da letra grega Sigma. Foi também nos anos 1930 que Plínio Salgado, juntamente com o jurista Miguel Reale, criaram o jornal diário “Ação” que possuía uma coluna voltada para o operariado.
Segundo Alencar Dotta, já durante o Estado Novo e quando estavam na clandestinidade, os integralistas eram vistos pelos agentes do DOPS como possíveis conspiradores contra a ordem política vigente. Mas foi somente após a chamada “Intentona Integralista”, em 1938, quando houve a tentativa de golpe para derrubar Getúlio Vargas, que os integralistas foram, de fato, vigiados, perseguidos e presos pelos agentes da polícia política. De 1939 a 1946, Plínio ficou exilado em Portugal e o movimento vai para a clandestinidade.
A partir de 1942, com a entrada do Brasil na Segunda Guerra, e diante do fato de que muitos integralistas eram simpatizantes dos países do Eixo, havia, em alguns DOPS de alguns estados brasileiros, a desconfiança de que os integralistas pudessem atuar como espiões da Alemanha, Itália e Japão. Mas de acordo com o pesquisador não houve a constatação de que os integralistas paulistas espionassem de fato para o Eixo.
“A partir de 1945 e, ao contrário do que dizem os livros didáticos, os integralistas voltaram à cena com o Partido de Representação Popular (PRP)”, informa o pesquisador. Nesta nova fase, os agentes do DOPS continuaram investigando mas não apenas os integralistas, e sim todos os outros partidos. “Os agentes iam às reuniões e aos comícios do partido e recolhiam material com o objetivo de acumular informações, escrevendo relatórios ora de forma neutra, ora de forma simpática, principalmente por conta do anti-comunismo propagado pelos integralistas. O DOPS via o discurso deles como democrático, já que o PRP era a favor do status quo, embora os integralistas sofressem muitas críticas da oposição”, conta o historiador.
Após 1964, durante a ditadura, o interesse do DOPS diminuiu, mas continuou presente. Os integralistas começaram a publicar o Jornal Renovação Nacional, de periodicidade quinzenal e abrangência nacional, e que funcionou abertamente até 1992. “Esse Jornal tinha como objetivos divulgar o integralismo, relembrar as ideias de Plínio Salgado, apoiar o regime militar e a “revolução” de 1964, e combater o comunismo, assim como atacar o Movimento Democrático Brasileiro [MDB] e a antiga União Soviética”, conta. Segundo Dotta, a vigilância do DOPS continuou, principalmente, devido a possibilidade de reorganização dos integralistas durante e após o regime militar.
DOPS
O DOPS foi criado logo após a Revolução de 1924 pelo então governador do estado de São Paulo, Carlos de Campos. A ideia era criar uma polícia que pudesse vigiar os movimentos sociais e políticos. “Ao pesquisar o DOPS, percebemos o quanto ele é riquíssimo, com uma vasta documentação, dossiês e prontuários”, finaliza o pesquisador.
A tese de doutorado de Renato Alencar Dotta deverá ser defendida em 2015. Quem orienta a pesquisa é a professora Maria Aparecida Aquino, da FFLCH.
Mais informações: email [email protected], com o pesquisador Renato Dotta
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