Alicia Nascimento Aguiar / Assessoria de Comunicação da Esalq
A deficiência de vitamina A (DVA) é um grave problema mundial de saúde pública. Esta acarreta consequências para a sobrevivência e a saúde, que poderiam ser evitadas com uma alimentação que suprisse a ingestão diária recomendada. Tal carência é a principal causa de cegueira noturna e do aumento da incidência de infecções, abortos e mortalidade em crianças menores de cinco anos, recém-nascidos, puérperas e gestantes. Um estudo realizado em parceria entre a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP e a Ohio State University (OSU), nos Estados Unidos, busca minimizar o problema utilizando-se da estratégia da biofortificação, recente tecnologia em implantação no Brasil que visa à redução das deficiências de micronutrientes por meio do melhoramento genético dos alimentos básicos.
O estudo de Paulo Roberto de Araújo Berni avaliou o ganho nutricional obtido em mandiocas (Manihot esculenta Crantz) e batatas doces (Ipomea Batatas Lam) biofotificadas com pró-vitamina A pelo programa brasileiro Biofort. Nessa dissertação de mestrado intitulada “Biodisponibilidade de betacaroteno em mandiocas e batatas-doces biofortificadas: estudos dos efeitos de genótipos e processamentos”, Berni relata que a base da dieta da população brasileira em risco de DVA é baseada em arroz, feijão, mandioca e batata, alimentos que não possuem quantidades significativas de pró-vitamina A. “O diferencial dos alimentos biofortificados está no aumento dos nutrientes diretamente nos vegetais por meio do melhoramento genético tradicional. No caso dos alimentos biofortificados para redução da hipovitaminose A, busca-se aumentar os teores de carotenoides pró-vitamínicos A nas culturas alimentares básicas”, declarou o pesquisador.
Berni ressalta que a mandioca é uma das culturas mais importantes na alimentação humana dos trópicos, principalmente para as populações de baixa renda, enquanto que a batata-doce é uma rica fonte de energia, fibras, minerais e vitaminas e possui grande potencial para biofortificação. “Meu objetivo na pesquisa foi avaliar os efeitos dos processamentos e genótipos sobre a estabilidade e a biodisponibilidade dos carotenoides em mandiocas biofortificadas e batatas-doces de polpa alaranjada submetidas ao cozimento e fritura”.
O pesquisador sinalizou três aspectos importantes em seu estudo: contribuir com os programas de biofortificação; comprovar o grande potencial que os alimentos biofortificados têm para reduzir deficiências nutricionais, no caso a vitamina A; e colaborar para melhor compreensão dos fenômenos envolvidos na estabilidade e biodisponibilidade de carotenoides frente aos processamentos e diferentes matrizes alimentares. “Os alimentos melhorados convencionalmente têm potencial para serem culturalmente bem aceitos e apresentarem diversas possibilidades de consumo ou utilização como matéria-prima para produtos tradicionais. Desse modo, a biofortificação com pró-vitamina A é uma estratégia inovadora que pode ser uma importante ferramenta na redução da deficiência de vitamina A, com a maior vantagem de não modificar os hábitos alimentares e culturais de produtores e consumidores”, explicou.
A pesquisa de Berni, sob orientação da professora Solange Guidolin Caniatti Brazaca, do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição (LAN), foi realizada em parceria com a Embrapa, IAC, Harvestplus e OSU. Programas de melhoramento genético da Embrapa e do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) forneceram os genótipos para o estudo. Foram empregados instrumentos e técnicas de ponta para avaliar a eficácia nutricional das mandiocas e batatas-doces, com destaque para o modelo de avaliação in vitro da biodisponibilidade de carotenoides, o qual emprega o cultivo de células intestinais humanas. Essas análises foram feitas na OSU e financiadas pela rede internacional Harvestplus. “Precisamos ter certeza que a pró-vitamina A nesses alimentos será adequadamente absorvida pelo organismo, que é o que chamamos de biodisponibilidade. A técnica que usamos nos Estados Unidos permitiu a avaliação da biodisponibilidade nos diferentes genótipos e processamentos. Esse método ainda não é empregado no Brasil e nós o estamos trazendo à Esalq”, finalizou o pesquisador.
Principais resultados
O melhoramento genético produziu genótipos de mandioca contendo até 23 vezes mais β-caroteno nas raízes frescas do que a variedade branca. Este acréscimo ocorreu majoritariamente no todo-trans-β-caroteno, que possui duas vezes mais atividade de vitamina A do que os isômeros cis-β-caroteno e outros carotenoides. Uma porção (100g) de mandioca biofortificada pode fornecer até 28% da IDR de vitamina A para crianças entre quatro e seis anos. Os cultivares Jari, da Embrapa, e o 06-01, do IAC, foram os que apresentaram as maiores quantidades de pró-vitamina A inicial e biodisponível.
O processamento das mandiocas resultou em degradação e isomerização do todo-trans-β-caroteno com consequente perda de atividade de vitamina A. A fritura possui o maior impacto, ocasionando maior perda, porém esta perda é compensada pela maior biodisponibilidade dos carotenoides. A fritura também aumentou a absorção pelas células humanas Caco-2 e resultou em maior quantidade de todo-trans-β-caroteno acumulado intracelularmente, isso significa que as mandiocas biofortificadas são mais eficientes quando fritas em óleo.
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