Do Jornal da USP
O Brasil está vivendo o final de um ciclo econômico cujas bases estão na expansão do acesso ao consumo, propiciada por fatores como o crescimento do salário real, a facilitação do crédito, os programas de transferência de renda e a exportação de commodities, avalia Roberto Mangabeira Unger, professor da Universidade de Harvard e ministro de Assuntos Estratégicos (2007-2009) na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Uma massa de gente ascendeu a padrões mais elevados de consumo e descobriu que somente isso não basta para ter uma vida melhor e mais fecunda. É preciso ter acesso a serviços públicos qualificados que o Estado brasileiro ainda não presta”, afirmou Mangabeira Unger em sua conferência na abertura do 3º Seminário Internacional de Inovação na Pequena e Média Empresa, na manhã desta quinta-feira (6) no auditório Prof. Francisco Romeu Landi da Escola Politécnica (Poli), na Cidade Universitária.
O ex-ministro defendeu que é preciso “rejeitar a visão minimalista da causa das pequenas e médias empresas (PME) e construir uma visão maximalista”. A visão minimalista é aquela que, entre outros fatores, conceitua as PME como empreendimentos familiares de pequena escala, constitui na economia um nicho estrutural relativamente retrógrado, abandonando às grandes empresas a possibilidade de ocupar o espaço vanguardista, e utiliza o lobby como meio para alcançar seus objetivos na reivindicação de facilidades tributárias e regulatórias.
Já na visão maximalista, descreveu Mangabeira Unger, o objetivo é, primeiro, promover uma forma ampla de democratização da economia de mercado e de descentralização do acesso aos recursos e oportunidades da produção, “onda na qual as PME ascenderão”. Segundo, a pretensão é de ocupar o espaço da vanguarda, trazendo as PME para a linha de frente da inovação tecnológica e organizativa.
Novo projeto nacional
O instrumento para a realização desse objetivo é a construção de duas agendas convergentes: primeiro, de um novo marco institucional da economia de mercado e, segundo, de construção das capacitações necessárias para o desempenho desse papel vanguardista. “O processo coletivo não é a manutenção de um lobby de uma minoria organizada que reivindica em favor de seus interesses próprios. O objetivo é a construção de um movimento protagonista de uma alternativa nacional”, apontou.
Em sua análise, o professor se utilizou de um arcabouço teórico no qual interpretou os novos paradigmas da produção no mundo e defendeu a necessidade de reorganizar a política industrial e o modelo educacional do País.
Para Mangabeira Unger, a força real necessária a sustentar essa alternativa – que descreveu como “a constituição de uma agenda mais ambiciosa que se defina não como lobby, mas como movimento na linha de frente de um novo projeto nacional” – já existe no País.
“Estou convencido de que o agente não precisa ser inventado. Ele já chegou na forma desses milhões de brasileiros que emergem e que agora constatam o esgotamento do nosso modelo estabelecido. O que falta é a tradução dessa causa num ideário e num caminho político”, disse.
“Não é o agente que falta, mas há um outro problema. Essa proposta minha contém uma pretensão perturbadora: é a pretensão da grandeza, e a ideia da grandeza no nosso país, vergado sob o jugo do colonialismo mental, é uma ideia incômoda. Que o Brasil se liberte, reconciliando-se com a ideia da grandeza”, concluiu.
Qualidade de vida
O 3º Seminário Internacional de Inovação na Pequena e Média Empresa – que tem coordenação do professor João Amato Neto, do Departamento de Engenharia de Produção da Poli – se estende até esta sexta (7). As palestras e debates incluem temas como cooperação para inovação nas PME, inovação e cooperação universidade-empresa e eco-inovação nas PME.
Na mesa de abertura, o professor Mauro de Mesquita Spinola, presidente da Fundação Carlos Alberto Vanzolini, afirmou que todas as ações voltadas à inovação nas empresas têm que receber mais atenção da Universidade e das fundações, e salientou que a gestão pública também precisa ser permeada pela inovação.
Para o professor José Roberto Castilho Piqueira, diretor da Escola Politécnica, o País precisa caminhar na direção da independência tecnológica, que está intimamente ligada à qualidade de vida. “Para melhorar nosso Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), precisamos de uma indústria inovadora. As portas desta escola estão abertas para a inovação e para a independência tecnológica”, ressaltou. O professor Vanderlei Bagnato, coodenador da Agência USP de Inovação, se integrou ao debate com Mangabeira Unger e ressaltou que o papel da agência é promover a cultura da inovação na Universidade.
A importância das PME na economia brasileira pode ser constatada em números: elas representam 99% dos negócios do País – são cerca de 8 milhões de empreendimentos que respondem por 60% dos 94 milhões de empregos formais e 20% do Produto Interno Bruto (PIB), proporção que chega a 50% em outros países.
A cobertura completa da abertura do seminário estará na próxima edição do Jornal da USP
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