Nicolas Gunkel / Assessoria de Imprensa da FEA
A relação causal entre o aumento da emissão de gases do efeito estufa (GEE) e as mudanças climáticas tem sido exaustivamente comprovada por uma série de relatórios internacionais. E a atípica seca que atingiu o estado de São Paulo no verão deste ano é só o exemplo mais próximo de porque devemos nos preocupar com a ocorrência de eventos extremos.
Diante deste preocupante quadro cuja responsabilidade recai principalmente sobre a indústria, algumas empresas têm procurado soluções para mitigar seus danos ao meio ambiente. Mas, ao contrário do que parece, não bastam apenas investimento e boa vontade para alcançar resultados positivos. É preciso pesquisa, estratégia e planejamento.
Para avaliar como as organizações estão lidando com esta nova demanda, um grupo de alunos de pós-graduação da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP realizou durante o primeiro semestre deste ano “um mergulho profundo na realidade” de sete importantes empresas: Petrobras, Suzano Papel e Celulose, ArcelorMittal Tubarão, CPFL Energia, Tetra Pak, AES Brasil e BRFoods. O resultado da pesquisa foi apresentado no dia 13 de agosto em seminário intitulado “Mudanças climáticas, estratégia empresarial e a redução de emissões de GEE”.
Ao elaborar um relatório com emissões de GEE, uma empresa deve levar em conta três níveis de medição. O escopo 1 diz respeito às emissões diretas de GEE, provenientes de fontes que pertencem ou são controladas pela própria organização como, por exemplo, caldeiras e fornos. O escopo 2 contabiliza as emissões de GEE oriundas da aquisição de energia elétrica e térmica que são consumidas pela empresa. O escopo 3, por fim, leva em conta todas as outras emissões indiretas, como a produção de matérias primas que são utilizadas pela empresa ou o transporte.
Apesar das particularidades de cada companhia estudada no último semestre, algumas características são comuns a elas. Via de regra, as companhias que se orgulham de ter evoluído no escopo 1 nos últimos anos, regrediram em algum dos outros escopos. Isto é, em termos absolutos, seus prejuízos ao meio ambiente continuaram aumentando.
Em casos nos quais as empresas foram comparadas com similares do mesmo ramo em países desenvolvidos, os números também assustaram. A Petrobrás, por exemplo, emite quatro vezes mais GEE por barril de petróleo do que a norueguesa Statoil, além de consumir três vezes mais energia e apresentar três vezes mais vazamentos de óleo.
Segundo os estudos, a maior parte das indústrias também peca por não desenvolver uma gestão estratégica de carbono com metas quantitativas. Mesmo quando há progressos na sustentabilidade, isso não ocorre segundo um planejamento.
De acordo com Isak Kruglianskas, professor do departamento de Administração e um dos orientadores dos projetos, a abrangência do conceito de sustentabilidade tem confundido algumas empresas, que se perdem e não conseguem perseguir metas claras. “As empresas que contemplam simultaneamente um número exagerado de temas como água, energia, emissão de gases, efeito estufa, segurança química e relacionamento com a comunidade, não conseguem atingir metas”, ponderou. “As que restringem seu foco a um número limitado de temas e criam métricas adequadas para integrá-los têm conseguido resultados significativamente superiores”.
Segundo o professor Jacques Marcovitch, também orientador dos projetos, a lentidão com que a maior parte das empresas tem reduzido a emissão de gases mostra a necessidade de criação de um conselho internacional para questões ambientais. “Precisamos de processos decisórios mais ágeis para a redução de emissão de gases do efeito estufa e preservação da cobertura vegetal”, explicou.
Marcovitch sustentou que, a exemplo da Organização Mundial da Saúde e do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que têm grupos de autoridades com poder imediato para prevenir tragédias humanas, a questão da sustentabilidade exige atenção especial. “Na área de mudanças climáticas e da preservação da biodiversidade, submeter-se ao consenso de 190 países tende a postergar decisões urgentes que deveriam ser tomadas”, defendeu. “Essa é questão que se colocará nas cúpulas de Lima e Paris nos dois próximos anos”, ressaltou.
Debate
Após as apresentações, houve debate, com uma mesa formada pelos professores José Goldemberg (Instituto de Energia e Ambiente), Tércio Ambrizzi (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) e Fátima Pereira Pinto (Ecouniverso Projetos Ambientais).
Fátima falou sobre a dificuldade de empresas mensurarem o escopo 3, uma vez que não têm o controle de toda a cadeia produtiva. Ela também ressaltou que cada empresa classifica o escopo 3 de uma maneira diferente, o que pode prejudicar comparações. “É necessário estar bem explícito o que faz parte de cada escopo para que possamos comparar”, defendeu.
O professor Ambrizzi declarou que os investimentos em pesquisa pelas empresas não podem se limitar apenas à redução de emissão de gases. Segundo ele, as organizações também precisam investir em projeções climáticas. “A mudança dos ventos, chuvas e temperaturas terão cada vez mais impacto com os eventos extremos. É um momento importante para atrair financiamento de empresas que precisam de informações acadêmicas”.
Para o professor Goldemberg, preocupa o fato de que muitos países evitam falar do aumento absoluto da emissão de GEE e, ao invés disso, divulgam que alguns índices específicos estão diminuindo. “Estão iludindo a si mesmos”, declarou. Ele também chamou atenção para as emissões do escopo 2, que têm crescido no Brasil por conta das dificuldades do setor elétrico (menos poluente). “Como algumas empresas estão acionando térmicas é claro que as emissões vão aumentar, mas esperemos que isso seja apenas um fator conjuntural”.
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